TEXTOS CRÍTICOS


TEXTOS CRÍTICOS PUBLICADOS 


Catálogo da exposição ENTRE CURADORIA A-Z, 2013 /  COME IN: CURATORSHIP (páginas 60-61)

Ana Zavadil (Curadora do Museu de Artes do Rio Grande do Sul)

A pesquisa de Denis Siminovich é a pintura em afluência com a fotografia na qual executa os desdobramentos sob a forma de collage – fotomontagem digital e pinturas mistas por meio de processos híbridos de criação. O trabalho configura-se em conceitualizadas, como ele se refere às séries de fotografias. Isso porque, por meio da documentação fotográfica digital acontecem manchas de naturezas diversas: virtuais, no meio digital, e pictóricas, quando as imagens são impressas. A pintura é concebida virtualmente, opticamente e mentalmente. A partir da estratégia de simulação digital o artista diz: 

“Permeio um universo onde faço a minha Arte como um ready-made de idéias visuais.” 

Para construir o seu ready-made, ele parte das operações de apropriações e fragmentações de imagens cotidianas que são hibridizadas e montadas para buscar outro sentido para os códigos visuais. A fotomontagem propõe uma interligação entre: a identidade das imagens, as imagens fotográficas digitais, a lembrança da pintura e a ação do artista como indivíduo criador de reflexões, que mesmo impressas pela máquina não deixam de estar próximas do humano. O gesto da pintura aqui é outro. É intenção quando Siminovich trata de temas como arte, sociedade, imagem, pintura, fotografia e visualidade, numa aproximação com  a identidade do sujeito e da sua própria, o imaginário da época em que vive e as relações das pessoas no mundo contemporâneo. 

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EXPOSIÇÃO FRAGMENTOS DE IDENTIDADES

Em seu processo artístico Denis Siminovich pesquisa questões relativas às hibridações a partir de cruzamentos de procedimentos ligados à tecnologia. Desde 2008 o artista vem desenvolvendo uma produção visual, com base na fotografia digital, compreendendo fragmentos de identidades de retratos e autorretratos, produzidos e apropriados.

Por definição, retratos e autorretrato são representações que o artista faz de seus semelhantes ou de si mesmo. Estas representações são historicamente ligadas a processos de personalização e de individuação, através da transmissão das características físicas e expressivas do indivíduo, que tiveram início no surgimento da modernidade, no Renascimento italiano.

As questões que emergem do trabalho atual de Denis Siminovich, no entanto, vão a contracorrente com a idéia da identificação de um Eu ou de uma subjetividade própria ao sujeito. Estão em maior consonância com os múltiplos regimes de despersonalização em operação na arte, desde os anos 70, tornando problemática a relação entre a imagem que o artista produz, em retratos e autorretratos, com a suposta identidade que lhes corresponderiam.

Através dos procedimentos de fragmentação e  (des)montagem digital, Denis Siminovich opera de maneira singular entre os regimes de despersonalização presentes na arte contemporânea. Ele consegue fazer reverberar seus procedimentos com problemas existenciais, sociais e políticas. Seus retratos e autorretratos sugerem processos de  alteridade que não se esgotam na operacionalidade visual obtida pelas fraturas nas imagens: propõem lançar inquietações sobre questões que envolvem o sujeito, tanto na arte como na vida.

Sandra Rey (Curadoria da Exposição Fragmentos de Identidades)

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EXPOSIÇÃO FRAGMENTOS DE IDENTIDADES

Acompanho o trabalho do Denis desde o início. E ele me surpreende a cada novo traço, a cada nova pincelada. Tenho certeza de que seu crescimento vem da seriedade com que encara seu trabalho, manifesta pela coragem de expor-se sem reservas e pelo desejo de configurar suas perplexidades.

Fernando Baril (Artista Homenageado)


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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES - DEPARTAMENTO DE ARTES PLÁSTICAS
LABORATÓRIO DE CRIAÇÃO DE TEXTOS II - ICLÉIA BORSA CATTANI

O Olhar Singular de Denis Siminovich

Alexandre Conrado
O trabalho de Denis Siminovich trás à tona questões cruciais à crítica da sociedade contemporânea. Ao colocar no foco central de suas investigações artísticas a compreensão da singularidade de seu olhar, e de sua forma particular de relacionar-se com o mundo que o cerca, Denis não tem a intenção de requerer para si o a posse de um "dom místico" que o colocaria no patamar de "gênio artístico", mas sim de reivindicar sua condição enquanto sujeito, capaz de tomar suas próprias decisões. Seu trabalho convida o público fruidor a refletir sobre seu papel e sua posição enquanto indivíduo social.
Dentre os alvos do olhar deste artista encontra-se a seriação - produção em série, típica de linhas de montagem. Sobre este aspecto, Cattani (2004) dedica um capítulo de seu livro homônimo, onde se ocupa do tema da repetição na arte moderna e contemporânea. Dois entre os aspectos problematizados pela autora merecem especial atenção na análise da obra de Denis: a repetição enquanto elemento de individuação e a mesma enquanto crítica ao novo.
Segundo Cattani, a repetição de um procedimento artístico contribui para a marcar a individualidade do artista, uma vez que a recorrência de similitudes entre as obras resultantes faz com que estas cumpram o papel de assinatura do artista. Denis, em seu trabalho Corpos Revelados (2002), adota uma série de procedimentos bastante específica e sistemática, na qual apropria-se de material descartado por fotógrafos retratistas - "corpos sem cabeça" - e os toma como modelo para a realização de uma de suas pinturas - realizadas em óleo sobre tela e nomeadas anonimamente com números. Embora cumprindo um rigoroso ritual de passos para que as peças aproximem-se nas suas qualidades formais, denota-se marcante o esforço do artista em atribuir uma diferenciação singular e individual às peças, a serviço do qual são acrescentados detalhes nos corpos, de modo que estes, mesmo desprovidos de rostos obtenham uma identidade.
Estabelecendo um diálogo paralelo com as pinturas também foram expostos - acomodados em uma caixa de cor branca - os fragmentos de fotografias que serviram de modelo às pinturas de Denis. Estes foram cuidadosamente montados pelo artista em uma tira dobrável de papel remetendo a rolos de filmes. Nestas tiras algumas cópias do mesmo corpo estão dispostas lado-a-lado e próximas a outros corpos em que as pessoas estão postadas em posições semelhantes reforçando o conceito da repetição e da produção em série. Desta forma, ao mesmo momento em que faz do seu processo sua marca singular, o artista deixa em suspenso a crítica à questão do indivíduo e da repetição.
Outro aspecto que não deve ser ignorado é o da repetição enquanto crítica ao novo. No caso Denis a problematização não encontra no seu cerne o postulado da "obra-prima" ou da criação "genial", mas sim à nova condição contemporânea e os meios massímicos de reprodução de ideologias. Sobre a questão da serialidade o artista expõe:
“(...)[as telas] constituem, para mim, a intensificação do conceito de anonimato das identidades e a acentuação de sua importância.” (Siminovich, 2002, p.51)
Também através de dedicatória de sua monografia de conclusão de curso "as pessoas que aparecem nos fragmentos de fotografia" torna-se evidente a importância dispensada pelo artista aos socialmente invisíveis. Mais do que àqueles que são anônimos é possível perceber que o olhar de Denis, nesta série, está preocupado com a questão da subjetivação. A capacidade de um pensamento crítico e de uma reflexão acerca de questões sociais encontra-se abalada na contemporaneidade por um sistema de acumulo de bens de consumo onde os espaços de vivência são, muitas vezes, substituídos pelo simulacro, e a experiência empírica por "verdades absolutas" fabricadas e veiculadas através dos meios de comunicação de massa.
Bartucci (2002) nos chama atenção para as "configurações subjetivas contemporâneas, nas quais o autocentramento se conjuga ao valor da exterioridade", ou seja, a prática social onde a obtenção de valores materiais, por vender ao indivíduo a ilusão de visibilidade e de aceitação no grupo social, se antecipa à constituição deste enquanto sujeito capaz de refletir acerca da realidade que o circunda. Neste sentido é possível crer que a investigação artística de Denis em muito corrobore a idéia de que, mais do que a figura metafórica de "corpos sem cabeça", ou de números em estatísticas de consumo, o público fruidor de seu trabalho deva exercer seu direito de pensar acerca das questões do meio social ao qual pertence. Nesta mesma série, mas especificamente na tela intitulada "no 3", o artista introduz a representação do "pião" como materialização de sua idéia de tempo e de resgate de memória. Diversas relações entre a passagem do tempo e as características intrínsecas do "brinquedo" são descritas na monografia do artista:
“Passei, com isso, a associá-lo [- o pião -] a memória do(s) tempo(s) (...) da passagem das horas, do jogo com o tempo.” (Siminovich, 2002, p.58)
A representação do "pião" carrega com sigo idéias como a de ciclo, de movimento, de tempo transcorrido. Em sua tela "no 6", o artista representa um "pião" junto a um corpo fragmentado - é importante perceber que esta fragmentação não poupa nem o próprio representante do tempo: o "pião". Cabe aqui uma reflexão sobre a qualidade do tempo contemporâneo, ou melhor, sobre o formato através do qual este tem se manifestado em nossos dias. Será que podemos dizer com convicção que ainda vivemos o tempo cíclico das horas descrito pelo giro do "pião"? Creio que seria mais coerente falar de um tempo entrecortado em instantes, mais próximo, talvez, dos fragmentos pintados pelo artista. Esta modalidade de percepção temporal é comum em nossa sociedade contemporânea, onde a demanda social é pela produtividade, minimização das perdas e maximização do lucro. Atualmente não são raras as reclamações acerca da escassez do tempo e é este tempo roubado que o artista se propõe a resgatar através da evocação das memórias perdidas, dos tempos perdidos e das cabeças perdidas. A obra de Denis encontra seu valor como depoimento do presente motivação ao resgate do sujeito contemporâneo.
Referências:

BARTUCCI, Giovanna (org.). Psicanálise, arte e estéticas de subjetivação. Rio de janeiro: Imago. 2002.
FARIAS, Agnaldo. Idéia Cattani. Rio de Janeiro: Funarte, 2004.



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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES - DEPARTAMENTO DE ARTES PLÁSTICAS
LABORATÓRIO DE CRIAÇÃO DE TEXTOS II - ICLÉIA BORSA CATTANI


O Reflexões sobre a Obra de Denis Siminovich
José Carlos Fernandes Saraiva

Se há uma grande diversidade na obra de Denis Siminovich, encontramos também em seu trabalho signos que se repetem. Falo da presença insistente de um peão que nela irrompe, vez por outra, fazendo um enigmático contra-ponto a sua narrativa visual. Esses peões habitam seu território plástico tal como nós semânticos a entrelaçar campos diversos de sua subjetividade. Não sabemos bem a que vem, mas eles estão ali a marcar presença dizendo talvez de um tempo que ora se conecta com a atualidade. Presente e passado simultaneamente fundidos nessa imagem lúdica da infância.

Inicialmente sua pintura prescindia de muitas cores, apenas o preto e o branco cobriam suas telas. Talvez um recurso continente, uma atenção maior às questões da forma e composição. Posteriormente, outras cores vão, paulatinamente, colorindo seu trabalho.

Paralelamente a pintura e depois agregando-se a ela Denis lança mão de fotos desprezadas encontradas no lixo de um estúdio fotográfico. São apenas troncos de pessoas que lá pousaram para tirar suas fotos 3X4. Esses corpos decapitados e anônimos tem um efeito impactante aos olhos do espectador e mais uma vez o enigma habita sua obra. Inicialmente se ocupa dessas fotos agrupando-as em caixas brancas a partir de relações lógicas, embora pouco perceptíveis; conjuntos estabelecidos pelas cores das roupas, pelo gênero das pessoas, por seus biótipos ou sua postura. Tais séries apresentadas no interior dessas caixas dão a incômoda impressão de corpos anônimos resignadamente aprisionados nesses niçhos. Essas imagens irão se transformar em pinturas e muitas delas compartilharão o espaço como seu enigmático peão e ascenderão as dimensões do corpo humano.


Também em sua pintura irá transitar do mundo real até a abstração. Tomando um elemento da realidade como ponto de partida fará essa transposição de um campo a outro. Investiga esse objeto que visto como urna metáfora buscará extrair dele todos seus traços metonímicos. seus cheios, seus vazios, sua textura. sua cor. Persegue, corno refere, sua potência ou essência.